Por Henrique Kazuo Uemura, advogado do Arystobulo Freitas Advogados
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou, em julgamento sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.203), a possibilidade de utilização do seguro garantia e da carta de fiança para suspender a exigibilidade de créditos não tributários em execuções fiscais.
A decisão, publicada em 17 de junho, consolida uma controvérsia que há anos dividia tribunais e traz segurança jurídica para empresas e instituições que buscam alternativas ao desembolso imediato de recursos.
O tribunal reconheceu que a apresentação dessas modalidades de garantia não apenas viabiliza a suspensão da cobrança, mas também deve ser considerada idônea, desde que observados critérios objetivos.
Entre eles, está a equiparação do seguro garantia ao depósito em dinheiro, desde que acrescido de 30% do valor do débito.
Também ficou definido que a Súmula 112/STJ e o Tema 378/STJ, aplicáveis exclusivamente a créditos de natureza tributária, não se estendem a créditos não tributários.
A fixação de prazo de vencimento para a garantia não a torna, por si só, inválida, cabendo ao juiz avaliar a idoneidade de cada caso.
A recusa pela Fazenda Nacional tem caráter meramente opinativo e deve ser devidamente fundamentada.
A análise sobre a suficiência ou não da garantia ofertada é atribuição do magistrado de primeira instância, e não do STJ, e a substituição da penhora por seguro ou fiança é possível, mas não constitui direito absoluto do executado.
Além disso, caso a suspensão da exigibilidade ocorra antes da inscrição em dívida ativa, o crédito não poderá ser inscrito ou cobrado judicialmente.
A decisão também recuperou critérios já previstos em normas administrativas para orientar a aceitação das garantias, sem, contudo, vincular o juiz.
No caso da carta de fiança, destacam-se exigências como a cláusula de solidariedade com renúncia ao benefício de ordem, a atualização do valor pelos mesmos índices aplicáveis à dívida ativa e a fixação de prazo de validade até a quitação do débito ou decisão judicial definitiva.
Em determinados casos, admite-se validade mínima de dois anos, desde que acompanhada da obrigação de substituição da garantia antes do vencimento. Já o seguro garantia é regido pelo Código Civil e pela Circular SUSEP nº 662/2022, que assegura a manutenção da cobertura mesmo em caso de inadimplência do tomador.
A norma prevê ainda a renovação automática da apólice e a comunicação obrigatória sobre seu vencimento com antecedência mínima de 90 dias.
Portarias da Procuradoria-Geral Federal e da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional reforçam a exigência de equivalência entre o valor segurado e o crédito discutido, acrescido de encargos legais, além da manutenção da vigência até a quitação ou extinção do débito.
Apesar de reconhecer a idoneidade do seguro garantia e da carta de fiança, o STJ reafirmou que apenas o depósito em dinheiro extingue a responsabilidade do devedor pela atualização monetária e pelos juros de mora.
Dessa forma, os valores garantidos por essas modalidades devem continuar sendo corrigidos até o pagamento efetivo, cujos índices de atualização monetária e juros devem observar o quanto já estabelecido no Tema 905/STJ, ainda que tal ponto não tenha sido aprofundado no julgamento recente.
A pacificação do Tema 1.203 representa avanço relevante para contribuintes que lidam com créditos não tributários, oferecendo alternativas menos onerosas ao depósito em dinheiro e, ao mesmo tempo, preservando a análise judicial caso a caso.
O acórdão reforça que a aceitação das garantias depende de fundamentação específica do magistrado, reduzindo a margem para recusa arbitrária pela Fazenda Pública.
Autor: Henrique Kazuo Uemura, advogado do Arystobulo Freitas Advogados