Análise XP: Maior convicção na trajetória de desinflação

Análise

Maior convicção na trajetória de desinflação

Veja trechos do Relatório Raio XP elaborado por Fernando Ferreira (Estrategista-chefe e Head de Research), Felipe Veiga (Estrategista de Ações), Raphael Figueiredo (Estrategista de Ações) e Lucas Rosa (Estrategista Quantitativo).

Cenário base: O ciclo de cortes começa em março, com seis reduções de 50 bps ao longo do ano, encerrando 2026 com a Selic em 12,00%.

Nosso posicionamento: Mantemos preferência por ações de alta qualidade, baixa alavancagem e sensíveis à dinâmica de juros — especialmente no segmento de Mercado de capitais (como B3 e BTG Pactual), que pode se beneficiar de um movimento relevante de realocação de renda fixa para renda variável.

Também seguimos construtivos em bond-proxies (como Eletrobras/Axia, Energisa e Iguatemi), cuja performance tende a responder de forma mais direta à compressão das taxas reais.

Riscos negativos: A materialização de uma reaceleração inflacionária ou um pacote fiscal maior que o esperado pode pressionar juros e câmbio, levando o Banco Central a adotar uma postura mais cautelosa diante de estímulos fiscais.

Esse ambiente pode gerar saídas de recursos — com institucionais locais ainda mais defensivos, aceleração de resgates em fundos multimercado e ações, e redução de posições de investidores estrangeiros à medida que a tese de cortes prolongados e significativos perde força.

Riscos positivos: Um cenário de inflação persistindo em queda rumo à meta — com bens em deflação e serviços finalmente cedendo — combinado a uma atividade econômica mais resiliente, e a um pacote fiscal mais moderado do que o antecipado, abriria espaço para um ciclo de cortes mais intenso ou prolongado. Nesse caso, a melhora das condições financeiras tenderia a destravar fluxos positivos, com maior apetite de institucionais locais e retomada das captações para fundos de ações.

Na sua decisão mais recente de política monetária, o Banco Central do Brasil enfatizou que agora tem maior confiança de que o nível atual da taxa Selic é suficientemente restritivo para garantir que a inflação convirja para a meta ao longo do horizonte relevante de política.

Trata-se de uma evolução relevante na estratégia de comunicação: embora o Comitê continue ressaltando a incerteza em relação à trajetória fiscal e às condições financeiras globais, o reconhecimento desse grau maior de convicção representa uma mudança sutil, porém importante, na função de reação.

 Isso sinaliza que, na ausência de choques exógenos, o ciclo de aperto atingiu um ponto de equilíbrio em que as taxas reais permanecem claramente contracionistas, mas a dinâmica da inflação já começou a se normalizar de forma mais clara.

Essa confiança crescente reflete dois desenvolvimentos macroeconômicos que se reforçam mutuamente.

Em primeiro lugar, a sequência de leituras de IPCA tem vindo em linha ou ligeiramente abaixo das expectativas, com as medidas de núcleo exibindo uma moderação disseminada e melhora nos índices de difusão.

Em segundo lugar, a atividade econômica tem se mostrado notavelmente resiliente, com a receita real de serviços em expansão nos últimos oito meses consecutivos e a temporada de resultados corporativos do 3T25 sendo a melhor dos últimos cinco trimestres.

Dessa forma, o cenário-base da nossa equipe macro é de que os cortes de juros devem começar em março, com um total de seis cortes de 50 bps, encerrando 2026 com a taxa Selic em 12,00%.

Do ponto de vista histórico, ciclos de afrouxamento monetário têm sido, de forma inequívoca, favoráveis às ações brasileiras.

Olhando para os últimos oito ciclos de corte de juros, o Ibovespa se apreciou, em média, 39,2%, o que reforça o potencial de assimetria positiva que normalmente acompanha a compressão da taxa de juros real.

Dois mecanismos explicam esse padrão recorrente: (i) a melhora de valuation por meio de uma taxa de desconto menor e (ii) a realocação da poupança doméstica da renda fixa para ativos de risco, à medida que o carrego da renda fixa se torna menos atrativo.

Apesar do rali recente do índice, o ciclo atual ainda se destaca com um desempenho inferior relevante em relação à média histórica.

Como discutido no nosso Raio-XP de novembro e reiterado no nosso último XPresso, grande parte da alta do mercado em 2025 foi inicialmente guiada por fatores globais — nossos resultados indicam que variáveis globais, especialmente FX e ações nos EUA, ganharam importância ao longo do ano.

Em contraste, fatores domésticos como o CDS do Brasil e as taxas nominais, que haviam ganhado relevância no fim de 2024 em meio à alta das preocupações fiscais, perderam boa parte de seu poder explicativo (correlações) para as ações locais.

No entanto, como destacamos anteriormente, o rali mais recente do mercado passou a ser cada vez mais impulsionado por fatores domésticos, como as expectativas de cortes de juros, a aproximação do trade eleitoral e a sólida temporada de resultados do 3T25.

Isso sugere que ainda há um espaço relevante de alta, mesmo que apenas parcialmente, para o precedente histórico.

Embora a reversão à média nunca seja garantida, a combinação de melhora da inflação, política monetária ainda restritiva e um prêmio de risco de ações acima da média configura uma combinação de fatores que, historicamente, precede períodos de forte performance de mercado.

Se o pacote fiscal esperado entre fevereiro e maio entregar uma trajetória crível de consolidação no médio prazo, ele pode atuar como catalisador para a próxima alta do mercado.

Com o Federal Reserve mantendo uma postura dependente de dados e evitando deliberadamente oferecer um guidance firme, não tomamos uma posição direcional em relação aos juros nos EUA.

Ainda assim, o comportamento histórico documentado em nosso estudo “Ações durante os ciclos de corte de juros nos EUA” fornece um arcabouço claro para entender como um eventual ciclo de afrouxamento monetário nos EUA se transmitiria para o Brasil.

Ao longo dos últimos oito ciclos de corte de juros, as ações brasileiras consistentemente superaram seus pares a partir do primeiro corte do Fed.

O Ibovespa entregou +32,1% em reais e +41,2% em dólares nos 12 meses seguintes ao corte inicial — bem acima dos retornos de índices locais de renda fixa, como IRF-M e IMA-B, e também à frente de referências globais como MSCI EM, MSCI ACWI ex-US e até small caps nos EUA.

A performance setorial reforça esse padrão: setores domésticos tendem a liderar nos meses que antecedem o primeiro corte, enquanto setores ligados a commodities (Mineração & Siderurgia, Óleo & Gás, Papel & Celulose) superam o mercado nos meses posteriores — em linha com um dólar mais fraco, reaceleração da liquidez global e melhora do apetite por risco.

A leitura para o Brasil se dá principalmente por dois canais:

1. Dinâmica de câmbio e fluxos: juros mais baixos nos EUA aumentam a atratividade do carrego em emergentes, reduz a pressão de alta sobre o real e, em geral, sustenta tanto fluxos de portfólio quanto investimento direto.

 2. Efeitos de valuation e liquidez: a queda das taxas de desconto nos EUA comprime os prêmios de risco globais e desloca investidores em direção a mercados de maior beta, levando à expansão do apetite por ações — o que tende a beneficiar desproporcionalmente o Brasil em relação à renda fixa local e a outros pares globais.

Assim, mesmo sem precisar antecipar a intensidade dos cortes do Fed, a assimetria para os ativos brasileiros é evidente.

Um ciclo de afrouxamento nos EUA historicamente oferece um forte vento de cauda externo — sustentando a moeda, melhorando os fluxos de capital, favorecendo setores cíclicos e de commodities e reforçando a boa performance das ações brasileiras.

Por outro lado, uma normalização da política monetária do Fed mais tardia ou mais fraca do que o esperado manteria as condições financeiras globais apertadas por mais tempo e retardaria a transmissão desses benefícios, ainda que os canais estruturais permaneçam intactos.

Diante desse pano de fundo macro, mantemos preferência por empresas de alta qualidade, baixa alavancagem e mais sensíveis a juros, que tendem a superar o mercado em fases iniciais de ciclos de afrouxamento.

Nosso foco está particularmente direcionado para dois grupos: Mercado de Capitais e bond-proxies com perfis de geração de caixa regulados ou semirregulados.

Mercado de Capitais: A tese para nomes desse setor é, sobretudo, uma função dos fluxos e da dinâmica comportamental do investidor brasileiro.

O ecossistema doméstico de investimentos segue com uma alocação muito baixa em ações, apesar de valuations atrativos e de taxas de juros reais prospectivas mais baixas. Historicamente, assim que os juros começam a cair com maior visibilidade sobre cortes futuros, o rebalanceamento de portfólios se acelera.

Nosso estudo do Raio-XP de outubro destacou que o potencial de realocação a partir da renda fixa pode ser substancial, dado o peso atual da poupança de varejo e institucional em instrumentos atrelados ao CDI.

A B3 tende a se beneficiar diretamente do aumento de volumes no mercado à vista, de maior atividade em derivativos e de maior engajamento do investidor local à medida que as mudanças de alocação ganham tração.

Ao mesmo tempo, o BTG Pactual está bem posicionado para capturar os componentes de wealth management e investment banking desse ciclo de fluxos, além das atividades de sales & trading.

Juros mais baixos normalmente impulsionam tanto as emissões corporativas quanto a originação de produtos estruturados, fortalecendo a geração de taxas, a lucratividade de market-making e o crescimento de AUM.

A combinação de alavancagem operacional, margens incrementais elevadas e uma tendência secular de maior formalização do mercado de capitais cria um pano de fundo favorável para esses papéis em um ambiente de queda de juros.

Bond-proxies (Eletrobras/Axia, Energisa, Iguatemi).

Nosso segundo grupo de preferência é composto por empresas com perfis de geração de caixa particularmente sensíveis à compressão da taxa de juros real — atuando, na prática, como bond-proxies.

Energisa (ENGI) historicamente apresenta beta elevado em relação aos ciclos de juros. Como utility regulada, com fluxos de caixa previsíveis, uma queda no custo de funding aumenta de forma relevante sua capacidade de alocar CAPEX, expandir sua base de ativos regulatórios e destravar valor dos ciclos de concessão em andamento.

Historicamente, ENGI tende a superar o mercado em ciclos de afrouxamento monetário, tanto por melhorias fundamentais quanto por uma melhora “mecânica” de valuation.

 Axia (AXIA) representa uma oportunidade diferenciada. No lado micro, o papel figura hoje entre as posições mais ativamente subalocadas no universo do MSCI Brazil.

Com os fatores negativos regulatórios e ligados à privatização gradualmente se dissipando, e a companhia migrando para um perfil pagador de dividendos, vemos espaço para que o investidor estrangeiro reavalie o papel.

À medida que fundos globais de emergentes rotacionem para geradores de renda de alta qualidade, AXIA pode deixar de ser um consenso de baixa alocação para se tornar um candidato preferencial à expansão de múltiplos.

A assimetria de posicionamento reforça isso. Iguatemi (IGTI) se beneficia de condições de funding mais favoráveis por um canal mais mecânico: uma parcela relevante de sua dívida é atrelada ao CDI.

Cortes de juros reduzem suas despesas financeiras quase imediatamente, melhorando o fluxo de caixa livre, ampliando sua capacidade de reinvestir em melhorias de portfólio e acelerando o processo de desalavancagem.

Combinada a um consumo resiliente e a fundamentos sólidos em ativos de shopping centers de localização prime, a IGTI está bem posicionada para se recuperar operacional e financeiramente à medida que a política monetária se torna mais acomodatícia.

Nesse grupo, o fio condutor é a solidez de balanço, a visibilidade dos fluxos de caixa e a sensibilidade ao custo de funding — atributos que os investidores normalmente buscam ao migrar de um regime de juros elevados para um mais acomodatício.

Embora a tese para cortes de juros esteja se fortalecendo, o timing e a magnitude dependerão quase inteiramente do pacote fiscal que o governo apresentará, esperado entre fevereiro e maio.

O BCB tem reiterado que a credibilidade fiscal é condição necessária para o afrouxamento, uma vez que afeta diretamente o prêmio de prazo, as expectativas de inflação e a taxa de juros neutra.

Se o pacote entregar uma consolidação crível no médio prazo — ainda que a trajetória de gastos no curto prazo permaneça pressionada — isso provavelmente destravaria a capacidade do banco central de iniciar um ciclo de afrouxamento gradual.

Em contraste, um pacote percebido como insuficiente ou baseado em premissas otimistas de receita poderia adiar os cortes, manter as taxas de juros reais elevadas por mais tempo e reduzir o apetite por risco de investidores domésticos e estrangeiros.

A trajetória fiscal, portanto, é o principal risco macro para nossa visão construtiva. Ela determinará a velocidade, a profundidade e a sustentabilidade do ciclo de cortes de juros e, por extensão, a magnitude da alta de ações que esperamos.

Em resumo, o Brasil entra em um ponto de inflexão crítico: a inflação moderou, a atividade segue resiliente e a taxa de juros real permanece profundamente contracionista — todos sinais de que o país está tecnicamente pronto para o início de um ciclo de afrouxamento.

Historicamente, esse tipo de ambiente tem sido um catalisador poderoso para o Ibovespa, com o ciclo atual ainda ficando aquém de seu análogo histórico de longo prazo e, portanto, oferecendo uma assimetria positiva relevante.

Nesse contexto, mantemos preferência por nomes de alta qualidade, baixa alavancagem e maior sensibilidade a juros em Mercado de Capitais e entre bond-proxies reguladas.

Esses segmentos oferecem uma combinação atraente de ventos favoráveis ligados a fluxos, benefícios mecânicos da queda de juros e catalisadores idiossincráticos, como assimetrias de posicionamento e melhora dos perfis operacionais.

A configuração final do pacote fiscal permanece como a variável-chave. Caso ele entregue credibilidade, o mercado de ações estará bem posicionado para um alta significativa — que, à luz da experiência histórica, tende a ser ao mesmo tempo relevante e ampla.

Conteúdo: Relatório Raio XP elaborado por Fernando Ferreira (Estrategista-chefe e Head de Research), Felipe Veiga (Estrategista de Ações), Raphael Figueiredo (Estrategista de Ações) e Lucas Rosa (Estrategista Quantitativo).

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