Crise do Banco Master e o antagonismo normativo do Sistema Financeiro Nacional | Artigo por André Fernandes Lima, professor de Economia da Universidade Presbiteriana Mackenzie e sócio de Crivelli Advogados, responsável pela área de Direito do Mercado Financeiro.
Na manhã de 18 de novembro, o Banco Central (BC) do Brasil decretou a liquidação extrajudicial do Banco Master S/A e de outras instituições do conglomerado, e submeteu o Banco Master Múltiplo S/A ao Regime de Administração Especial Temporária.
Esse episódio é apenas mais um reflexo das tensões que vêm se acumulando no Sistema Financeiro Nacional (SFN), especialmente após a tentativa frustrada de aquisição de parte do Banco Master pelo Banco Regional de Brasília (BRB), proposta que foi protocolada junto ao BC, mas não recebeu aprovação.
Além disso, o noticiário econômico tem sido marcado por casos de fraudes milionárias, especialmente envolvendo fintechs, e pelo uso indevido dessas instituições por organizações criminosas, o que levanta sérias preocupações sobre a solidez e a segurança do sistema.
Diante desse cenário, torna-se essencial analisar o arcabouço legal que rege tanto a regulação quanto a resolução das instituições que atuam no SFN.
O Conselho Monetário Nacional (CMN) atua como órgão normativo, enquanto o Banco Central exerce a função de entidade supervisora.
No campo da regulação, ambos têm competência para estabelecer regras sobre o capital mínimo exigido das instituições financeiras, conforme previsto no artigo 4º, inciso XIII, da Lei 4.595/64.
Essa prerrogativa foi recentemente exercida com a publicação da Resolução Conjunta nº 14, em novembro de 2025, que reformulou a metodologia de apuração do limite mínimo de capital e patrimônio líquido das instituições autorizadas a funcionar pelo BC.
A nova resolução representa uma mudança significativa, pois estabelece limites mínimos de capital com base nas atividades desenvolvidas pelas instituições, como captação, investimento e operações, além de considerar o uso intensivo de tecnologia.
Essa atualização surge em resposta às fraudes recentes que abalaram o sistema, especialmente aquelas envolvendo fintechs, e busca fortalecer a estrutura financeira das instituições.
Até então, as exigências de capital estavam defasadas, sem qualquer correção inflacionária, e eram determinadas apenas pelo tipo de instituição.
Com a Resolução Conjunta nº 14, passa-se a exigir capital mínimo também para cobrir os custos iniciais de operação e os serviços intensivos em infraestrutura tecnológica.
Essas novas exigências impõem um capital mínimo específico para instituições que operam com tecnologia intensiva, variando entre R$ 5 milhões e R$ 10 milhões.
Além disso, há valores adicionais conforme as atividades desenvolvidas, o que pode elevar significativamente o montante necessário para operar.
Um exemplo claro é o caso das instituições que utilizam o termo “banco” em sua nomenclatura, que devem adicionar R$ 30 milhões ao capital apurado.
Com isso, operar como banco comercial passou a exigir um capital mínimo mais de 300% superior ao anteriormente exigido.
Enquanto a regulação avança com medidas modernas e robustas, o mesmo não pode ser dito sobre os mecanismos de resolução.
O BC possui autonomia para implementar regimes de resolução, dentro de três opções: Regime de Administração Especial Temporária (RAET), Intervenção e Liquidação Extrajudicial.
Esses regimes são amparados por leis antigas, como a Lei 6.024/74, que trata da intervenção e liquidação extrajudicial, e a Lei 2.321/87, que institui o RAET.
Em 1997, a Lei 9.447 introduziu a responsabilidade solidária dos controladores das instituições sujeitas a esses regimes.
No entanto, essas normas não acompanharam a evolução do mercado financeiro, especialmente no que diz respeito à tecnologia e à complexidade das operações atuais.
O resultado é um sistema de resolução que falha em seus objetivos principais: salvar instituições viáveis e liquidar rapidamente as inviáveis.
Muitas vezes, instituições com potencial de recuperação não são salvas, enquanto outras permanecem em um limbo jurídico por anos, prejudicando investidores e depositantes.
Uma análise dos casos de resolução aplicados pela autarquia revela que, entre bancos comerciais, de investimento e múltiplos, foram registrados 111 casos: 20 RAETs, 24 intervenções e 67 liquidações extrajudiciais.
Dessas, a maioria resultou no encerramento das atividades, com apenas uma ainda ativa: o Banco Rural S/A, cuja liquidação extrajudicial foi decretada em 2013 e permanece em curso.
Em 1995, foi criado o Fundo Garantidor de Créditos (FGC), uma associação privada sem fins lucrativos que protege depositantes em caso de intervenção ou liquidação.
O limite de garantia evoluiu ao longo dos anos, chegando a R$ 250 mil por CPF/CNPJ, com teto de R$ 1 milhão a cada quatro anos.
Desde 1996, o FGC pagou R$ 9,2 bilhões em garantias a 4,2 milhões de clientes, em 32 dos 59 casos de resolução decretados.
No cenário internacional, o Financial Stability Board (FSB) publicou em 2011 os “Atributos-Chave de Regimes Efetivos de Resolução”, endossados pelo G-20. O Brasil comprometeu-se a adotá-los, mas ainda não os implementou integralmente.
Em 2019, foi proposto o Projeto de Lei Complementar PLP 281/2019, que prevê regimes modernos de estabilização e liquidação compulsória, com uso de fundos privados e empréstimos públicos apenas como último recurso. Apesar da aprovação de urgência em 2024, o projeto segue parado no Congresso.
Vivemos, portanto, uma contradição normativa: enquanto a regulação avança com medidas modernas, os mecanismos de resolução permanecem presos a normas arcaicas.
A esperança é que, diante da atual crise, o Congresso finalmente se mobilize para aprovar o PLP 281/2019 e alinhar o Brasil aos padrões internacionais de estabilidade financeira.
Autor: André Fernandes Lima, professor de Economia da Universidade Presbiteriana Mackenzie e sócio de Crivelli Advogados, responsável pela área de Direito do Mercado Financeiro.
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