Gabriel Galípolo, presidente do Banco Central do Brasil (BC), disse que a política monetária está fazendo efeito. “Mas de forma lenta e gradual”, afirmou, ao participar da 10a. edição do Fórum de Investimentos, realizado hoje (12/11) pela Bradesco Asset, em São Paulo.
Em outras palavras, a elevada taxa de juros, em 15% ao ano, está fazendo efeito para controlar a inflação, mas num ritmo menor que o desejado pelo Banco Central.
Veja abaixo trechos das declarações do presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo:
“A progressão, ainda que lenta e gradual, da trajetória da inflação, do tipo de convergência para meta, que está refletindo, acho que, em todas as análises, está refletindo também nas projeções dos economistas”.
“O lento e gradual, lógico, é bastante incômodo para o Banco Central, mas, por outro lado, esse gradual, vamos chamar assim, ele também colabora para emagrecer o risco (de inflação)”.
“Existia um receio de que o Banco Central colocasse a taxa de juros num patamar bastante restritivo do ponto de vista de taxa de juros”.
“Existia também algum receio de que você tivesse um declínio mais agudo da economia, alguma retração econômica mais intensa. Os dados também não vêm mostrando isso”.
“O que vem mostrando é uma economia que está desacelerando, no sentido que está crescendo ainda, mas a taxas menores”.
“Esses dois riscos vêm emagrecendo e vem se delineando num cenário onde, sim, a política monetária tem feito efeito, mas esse efeito de uma maneira gradual e lenta. E gradativamente caminhando para aquilo que é a nossa meta”, afirmou o presidente do BC, Gabriel Galípolo.
Para contextualizar, vale ressaltar que a meta de inflação do Banco Central é de 3% ao ano, com tolerância de 1,5 ponto percentual para cima (teto de 4,5% ao ano) e de 1,5 ponto percentual para baixo (piso de 1,5% ao ano).
Por outro ângulo, com a taxa básica de juros (Selic) em 15% ao ano para convergir a inflação para a meta do Banco Central, atualmente, a taxa real de juros no Brasil está entre as maiores do mundo.
Como o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, observa o cenário internacional?
A gente tem sempre trabalhado com essas duas palavras (incerteza e adversidade). Engraçado — talvez eu seja uma palavra — mas é curioso que temos trabalhado entre incerteza e adversidade.
Infelizmente, quando se reduz a incerteza, geralmente é porque um cenário se materializou e ficou mais adverso. Ou seja, não é algo muito positivo. Quando uma incerteza se reduz, muitas vezes é porque um risco se concretizou. Esse é um ponto importante e, de certo modo, negativo.
Acho que isso reforça o nosso cenário atual e a nossa postura de ser mais cautelosos e mais dependentes de dados. Sabemos que depender de dados tem um custo: o de eventualmente ficarmos um pouco mais atrasados na nossa reação, digamos assim. Mas, se analisarmos todos esses cenários de choques e incertezas, a discrepância entre o que se imaginava originalmente e o que realmente aconteceu tem sido bastante alta.
Vejamos o que se esperava a partir do anúncio do “tarifaço” e o que realmente ocorreu com a economia global: o resultado foi bem diferente do que se imaginava naquele momento. Ainda enxergo riscos elevados do ponto de vista da incerteza. E aquilo que foi reduzido em termos de incerteza me parece ser, na verdade, a materialização de alguns riscos que estavam em potência. O impacto dessa materialização tem sido surpreendente em praticamente todas as projeções econômicas que temos visto.
É por isso que não temos sinalizado muito sobre passos futuros — temos preferido aguardar e observar.
Se olharmos historicamente o que aconteceu no cenário internacional, podemos lembrar da eleição do presidente Trump. Naquele primeiro momento, quando ele venceu, o mercado interpretou de forma positiva: acreditava-se que ele teria um mandato pró-mercado, com redução de impostos corporativos, desregulamentação econômica e estímulo ao crescimento.
O Brasil, por outro lado, acabou sendo impactado. Somos vistos como uma economia de “beta” mais elevado e, além disso, não temos uma ligação tão forte com a cadeia de valor norte-americana.
Quando comparamos com o primeiro “tarifaço”, começou uma discussão sobre regionalização como alternativa à globalização centrada na economia americana. Mas, ao observarmos esse movimento, percebemos que foi muito mais uma busca por caminhos alternativos para chegar ao mercado dos Estados Unidos.
Vimos, por exemplo, uma redução nas exportações da China para os EUA, mas um aumento das exportações do México e do Vietnã. Ou seja, criou-se um novo caminho comercial, deslocando a curva de oferta para um ponto menos favorável.
A partir da vitória de Trump, entendeu-se que aquele movimento seria positivo para o mercado, pois estimularia o crescimento econômico. No entanto, economias mais ligadas aos EUA se beneficiariam mais do que o Brasil, que é menos correlacionado.
Ao longo de 2025, essa interpretação se inverteu. Passou-se a acreditar que o “tarifaço” viria mesmo, o que prejudicaria mais o México. O Brasil, por ter mais parceiros comerciais e depender menos das exportações — sendo uma economia mais voltada à demanda doméstica e exportadora de commodities —, estaria mais protegido desse tipo de choque.
Entre abril e maio, começamos a observar com mais cautela o mercado de títulos americanos, que deu sinais de “areia na engrenagem”. Esse talvez tenha sido um momento importante de redução do ímpeto no acirramento geopolítico.
Como costumo citar, o cientista político Vicente Carvalho — nosso consultor — tem uma frase muito espirituosa. Ele conta que já pensou em ser Papa, presidente da República e até jogador de beisebol, mas depois concluiu:
“O que eu gostaria mesmo é de ser o mercado de títulos de dívida soberana, porque aí eu posso intimidar quem eu quiser.”
Quando o mercado de dívida começou a travar um pouco, senti que foi um ponto de inflexão importante.
Vimos então uma leve desvalorização do dólar, mas não por uma fuga de ativos americanos. Na prática, é muito difícil contornar os Estados Unidos: a liquidez e a profundidade do mercado de títulos americanos são muito superiores às de qualquer outro país. Mesmo na Europa, não há unificação fiscal — há títulos alemães, gregos etc. —, mas não “títulos europeus”.
Se alguém quer se beneficiar do que está acontecendo no mercado de ações (especialmente com tudo que envolve IA), é quase impossível não investir nos Estados Unidos.
O que parece ter ocorrido, então, foi que os investidores continuaram aplicando em ativos americanos, mas fazendo hedge para se proteger de uma eventual desvalorização do dólar. Não se tratava de sair dos ativos, mas de se proteger com derivativos.
Há quem diga que, no ano anterior, muitos estavam sem hedge, e o que ocorreu foi apenas um retorno à média. Essa mudança reflete uma nova percepção de risco. Hoje, isso parece estar mais correlacionado com o ciclo de política monetária.
Acredito que os receios sobre fragmentação comercial estão se tornando menos incerteza e mais realidade — uma materialização do cenário em formação. No caso da inflação dos EUA, o mercado enxerga mais uma mudança de nível de preços, e não um processo inflacionário contínuo. Mesmo que o impacto do “tarifaço” venha de forma fragmentada, não parece haver um desancoramento das expectativas de médio e longo prazo.
Por fim, há algum receio sobre os desdobramentos financeiros desse contexto — ou seja, quais podem ser os efeitos no campo financeiro decorrentes da elevação das tensões geopolíticas. Esse é, em resumo, o cenário atual.
É muito difícil contornar os ativos americanos e o dólar. Historicamente, países que detêm a moeda de reserva internacional apresentam déficits elevados em transações correntes. Isso é um clássico.
Se olharmos para a história econômica, inclusive durante a Primeira e a Segunda Guerras Mundiais, havia grande debate — como o de Churchill tentando voltar ao padrão-ouro —, muitos economistas já discutiram essas implicações.
Evento: Fórum de Estratégias de Investimentos 2026 da Bradesco Asset
Foto no evento: Karim Kahn / Divulgação – Bradesco Asset